4.1.06

Retrospectiva 2005

Uma lista de melhores filmes do ano que se propõe destacar 10 produções entre as quase 280 estréias em circuito comercial é, por definição, subjetiva, incompleta e volúvel. Subjetiva pois trata-se de um recorte pessoal de uma ampla gama de lançamentos, cuja análise é invariavelmente influenciada pelo momento e pelas condições em que se viu o filme. Incompleta pela impossibilidade de se assistir a todas as estréias e por saber que, em alguns casos, se determinados filmes tivessem sido vistos, poderiam certamente figurar entre os melhores do ano e formar uma nova lista. E, finalmente, volúvel, pois as impressões sobre um determinado filme evoluem e se alteram ao longo do tempo – análises são amadurecidas, opiniões são reconsideradas, novas luzes são lançadas sobre facetas ainda não observadas – o que faz com que alguns filmes subam ou caiam em nosso conceito ao longo do tempo.
Entretanto, trata-se também de um exercício extremamente saudável: fazer uma retrospectiva e reflexão sobre os filmes que se viu ao longo de um ano, detectar convergências ou discrepâncias entre filmes e diretores que se admira, aprofundar a análise sobre determinadas obras. E saímos no fim com a certeza de que fomos injustos, mas que tal injustiça era inevitável. O principal critério, embora não o único, que pautou minhas escolhas foi o impacto que o filme causou quando o vi pela primeira vez. Pois antes de análises técnicas e teóricas, estudos e reflexões, o cinema tem uma capacidade de diálogo direto com o espectador que poucas artes possuem. E é nesse deslumbramento primeiro diante de um filme (que também é influenciado, e muito, pelas qualidades técnicas e teóricas da obra) que me pautei para selecionar meus destaques do ano.
2005 foi um ano com muitos lançamentos de bom nível, tanto de diretores consagrados quanto de estreantes, mas também de muitas ausências, algumas que serão corrigidas em 2006 (como 2046 e Brokeback Mountain) e outras que provavelmente nunca o serão (caso de Last Days, Les Amants Réguliers e Three Times). Algumas boas surpresas, algumas decepções, reencontros com velhos amigos ou descoberta de novos. É curioso notar que muitos dos filmes destacados não chegam a ser o melhor de cada diretor (como no caso de Godard, Cronemberg, Lucrecia Martel, Miyazaki e Coutinho), mas ainda assim são obras de tamanho impacto e força que impressiona a capacidade desses diretores em manter uma produção de qualidade média tão elevada. Alguns filmes foram galgando posições ao longo do tempo, conforme as impressões iniciais iam se enriquecendo (caso de Brown Bunny), outros fincaram seu posto desde o início (como Menina de Ouro) ou, ainda, entraram na lista no apagar das luzes de 2005 (o maravilhoso Reis e Rainha). Há ainda a alegria de dois títulos (que poderiam ser mais) que extrapolaram o gueto do ranking dos filmes nacionais e figuram entre os melhores do ano, independentemente da nacionalidade: a obra-prima Cinema, Aspirinas e Urubus, longa de estréia de Marcelo Gomes, e o mais novo documentário do mestre Coutinho, O Fim e o Princípio.
A existência de um ranking de filmes nacionais, aliás, é justificada pela necessidade de se ressaltar e valorizar o bom momento que estamos vivemos (momento esse devido menos a um fortalecimento da estrutura de produção nacional do que ao talento individual de alguns diretores), e é com enorme alegria que vimos em 2005 o lançamento de dois filmes marcantes, de personalidade, produzidos fora do eixo Rio-São Paulo e que, por si só, já justificariam a descentralização dos recursos aplicados para a produção nacional: o já citado Cinema, Aspirinas e Urubus e Cidade Baixa, ambos filmes de estréia de diretores promissores. Por último, um voto de protesto: Signo do Caos é o derradeiro filme de um dos maiores e mais revolucionários cineastas brasileiros de todos os tempos, Rogério Sganzerla, premiado em Brasília em 2003, lançado postumamente quase três anos depois. O desprezo com que as distribuidoras e o mercado exibidor tratam os filmes que buscam a reflexão, que exploram novas linguagens, que se propõem ser algo além do puro entretenimento, causaram não apenas o longo atraso na estréia do filme, como também o lançamento com pouquíssimas cópias, em circuito reduzido e por poucas semanas. Não vi o filme. É um dos melhores do ano.
TOP 10 de 2005
  1. Menina de Ouro, de Clint Eastwood
  2. Cinema, Aspirinas e Urubus, de Marcelo Gomes
  3. Nossa Música, de Jean-Luc Godard
  4. Marcas da Violência, de David Cronenberg
  5. A Menina Santa, de Lucrecia Martel
  6. Reis e Rainha, de Arnaud Desplechin
  7. Brown Bunny, de Vincent Gallo
  8. Bom Dia, Noite, de Marco Belocchio
  9. O Castelo Animado, de Hayo Miyazaki
  10. O Fim e o Princípio, de Eduardo Coutinho

Menção Honrosa: Episódio 531 de CSI, com direção de Quentin Tarantino, que embora não tenha sido exibido na tela grande é cinema em sua melhor forma.

TOP 5 Nacionais

  1. Cinema, Aspirinas e Urubus, de Marcelo Gomes
  2. O Fim e o Princípio, de Eduardo Coutinho
  3. Signo do Caos, de Rogerio Sganzerla
  4. Cidade Baixa, de Sérgio Machado
  5. Quase Dois Irmãos, de Lúcia Murat