Brasília 18%
Brasília 18%, de Nelson Pereira dos Santos, Brasil, 2006 - Cabine
Considerado um dos maiores diretores brasileiros, Nelson Pereira dos Santos é responsável por clássicos do cinema nacional como Rio, 40 Graus, Vidas Secas e Memórias do Cárcere. Desde 1994, porém, vinha se dedicando a documentários, tendo alcançado bons resultados no gênero em filmes como Raízes do Brasil, díptico sobre a vida e a obra de Sérgio Buarque de Holanda.
Foi através do documentário, inclusive, que surgiu a possibilidade de seu retorno à ficção. Contratado por uma TV francesa para documentar os cem primeiros dias do governo Lula, Nelson partiu em direção a Brasília com sua equipe. Como o projeto não foi pra frente, o diretor resolveu tirar da gaveta um roteiro que se passava na capital nacional e assim surgiu Brasília 18%, sua primeira ficção em doze anos.
Entretanto, esse longo período ausente da ficção parece ter prejudicado sua habilidade em “retratar na tela a vida, as histórias, as lutas, as aspirações de nossa gente”, anseio proclamado por ele mesmo em 1951. Brasília 18% carece desse corpo-a-corpo com a realidade, por mais contraditório que isso possa parecer em se tratando de um filme cuja temática não poderia ser mais atual: Olavo Bilac, um legista que hoje mora nos EUA, é chamado de volta ao Brasil para realizar a autópsia de uma jovem assassinada e acaba mergulhando em um escândalo que envolve políticos do alto escalão, subornos, crimes e CPIs.
Através de uma trama de investigação e mistério, o filme se limita à simples denúncia da corrupção em Brasília – fato notório e cotidiano – sem se aprofundar numa análise ou discussão a partir disso. Em um recurso semelhante ao utilizado por Sérgio Bianchi em seus filmes, aponta-se a falência geral da sociedade, sem buscar um confronto real e direto ou soluções para o mal exposto. Isenta-se assim de discutir responsabilidades (se todo mundo é culpado, ninguém é culpado) a ponto de desenhar um final onde tudo volta ao equilíbrio anterior, relegando o país a um eterno mar de lama, como se nada daquilo dissesse respeito ao protagonista (e conseqüentemente ao espectador) e este pudesse voltar à tranqüilidade de sua vida longe do Brasil.
No plano formal, o filme também deixa a desejar, com uma mis-en-scène e fotografia que não parecem ter sido suficientemente pensados e trabalhados. Os diálogos e as atuações são muitas vezes empostados e a decisão de batizar os personagens com o nome de vultos da literatura brasileira reduz-se a uma simples brincadeira intelectual, sem nenhum significado mais profundo.
Nelson perdeu a chance, com Brasília 18%, de realizar um necessário e urgente retrato da situação política de nosso país, saindo-se com um filme de pontas soltas e mal resolvidas, distante, portanto, da qualidade do diretor contestador, polêmico e genial que já provou ser. Com isso, perde o cinema nacional e, o mais grave, perde o Brasil.
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