23.3.06

A Máquina

A Máquina, de João Falcão, Brasil, 2005 - Cabine

Às vezes as boas surpresas vêm de onde menos se espera. Diler Trindade é hoje um dos maiores produtores brasileiros de cinema, cujos filmes já atingiram a marca de mais de 30 milhões de espectadores. Os números superlativos, entretanto, restringiam-se até agora à quantidade, uma vez que suas produções estavam longe de serem dignas de nota: os filmes-franquia de Xuxa, Didi, Padre Marcelo Rossi, Angélica, entre outros. E quanto à qualidade? Nas palavras do próprio Diler: “entendo-a como um conceito relativo. Como gosto não se discute, o que seria do amarelo se todos gostassem do azul, ou da mortadela se todos gostassem de caviar”.
A Máquina, longa de estréia de João Falcão produzido por Diler Trindade, não chega a ser a obra redentora da filmografia do produtor, mas é seu primeiro movimento em busca de uma nova equação: e se misturássemos o azul ao amarelo e oferecêssemos um bom presunto ao invés da mortadela? Será que o público não responderia à altura?
Baseado no livro homônimo de Adriana Falcão (já adaptado também para o teatro), A Máquina conta a história de amor entre Antônio (Gustavo Falcão) e Karina (Mariana Ximenes), moradores de uma pequena cidade do sertão nordestino que tem visões opostas sobre seus destinos: ele quer construir sua vida em Nordestina, ela quer ganhar o mundo e tornar-se atriz. Para não perde-la, Antônio promete trazer o mundo até ela, e para isso desafia o tempo e a morte.
João Falcão opta por uma estética próxima a mini-séries da Globo como O Auto da Compadecida (que roteirizou) e Hoje é dia de Maria para criar um tom de fabula à narrativa, para o que colabora também a cenografia de Marcus Figueiroa, com a cidade de Nordestina inteiramente recriada em estúdio, e a fotografia de Walter Caravalho, de cores fortes e vibrantes.
Os belos diálogos se aproximam da literatura de cordel e a ótima trilha sonora, composta pelo DJ Dolores e que inclui uma canção inédita de Chico Buarque, apropria-se da música nordestina, modernizando-a. O filme aposta nesse diálogo com uma cultura regional, ainda que estilizada, para ampliar seu apelo junto ao grande público.
Infelizmente o filme perde em alguns momentos seu ritmo (apressando-se ou arrastando-se sem nenhum motivo aparente) e em outros, a famosa “estética Diler” acaba sobrepondo-se à do diretor, prejudicando o filme pelo apelo a um popular excessivamente simplório e parvo, como nos trechos de musicais intercalados ao longo do filme ou nas reações desmesuradas dos personagens que ouvem o relato da história de um Antônio envelhecido (Paulo Autran, em uma atuação impecável como de costume).
Apesar dos percalços, A Máquina é um bom entretenimento, leve e despretensioso, que, diferentemente da maioria dos exemplares do gênero, não ofende ao espectador mais exigente. Uma bela tentativa de um cinema popular de qualidade que merece encontrar seu público.

5 Comments:

Anonymous Anônimo said...

bom texto..

24/3/06 15:35  
Blogger Leonardo Mecchi said...

Obrigado (quem quer que seja...)

24/3/06 15:41  
Blogger Guilherme Martins said...

Acho que nesse caso em particular, estou inclinado a preferir a mortadela... Hehehe. Mas não dá pra negar uma leve virada na carreira do Diler, se você somar A Máquina (gostando-se ou não) e Um Lobisomem na Amazônia do Ivan Cardoso, ambos filmes com apelo popular, mas de uma forma menos direta como os antigos veículos para celebridades.

25/3/06 19:13  
Blogger Marcos A. Felipe said...

Eu não fui ver esse A Máquina por pura falta de interesse no último FestNatal. Dos filmes, claro, acabei preferindo Bens Confiscados. Mas pelo menos A Máquina foge do "espaço social", "político" e "histórico" que domina, ainda que bem menos, o cinema brasileiro. Talvez seja mesmo interessante ver esse filme.

Marcos
http://focopotiguar.zip.net/

p.s.: ei, tire esse sistema de código dos comments. Só consigo comentar aqui, creio que mais gente, pelo blogger. hehe

27/3/06 07:48  
Blogger Leonardo Mecchi said...

Guilherme,

Tinha me esquecido que o Diler estava produzindo o novo filme do Ivan Cardoso. Sem dúvida uma mistura curiosa, mas que reforça essa busca de diversificação do Diler.

Marcos,

Sem dúvida eu também optaria pelo Carlão se tivesse que escolher entre os dois, mas se você assistir "A Máquina" depois me diga o que achou. Quanto ao código de verificação, estava recebendo um monte de spams nos meus comments, então tive que colocar isso para evitar esses spams. Mal necessário, infelizmente.

27/3/06 10:57  

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